segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Esgotada, a gigante pede ajuda

Oh, como os poderosos despencaram! Esta pode ser uma maneira estranha para caracterizar uma empresa que anunciou sua disposição de despender US$ 44,6 bilhões para fazer a maior tomada hostil de controle de sua história. Uma empresa que provavelmente vai gerar cerca de US$ 60 bilhões em receitas quando seu ano fiscal terminar, em junho. Uma empresa cuja fatia de mercado no campo dos seus principais produtos é ainda grande, apesar de recentes incursões da parte do seu brilhante concorrente.

Não tendo conseguido desafiar o Google na área que mais lhe interessa - publicidade online -, viu sua alternativa reduzida à compra do mais próximo, embora ainda distante, concorrente do Google.

Em muitos aspectos, a empresa tornou-se aquilo que Bill Gates temia - vagarosa, burocrática, lenta na sua resposta às novas formas de concorrência -, como ocorreu com a IBM quando a Microsoft convenceu a gigante tecnológica da época a usar o seu sistema operacional . O PC da IBM foi introduzido no verão (nos Estados Unidos) de 1981. Já se passaram quase 27 anos e o produto básico da Microsoft ainda é o seu sistema operacional, hoje chamado Windows - e o seu aplicativo Office, que roda no Windows.

Produtos que renderam bilhões de dólares anuais para a empresa. A mais recente versão do Windows, que entrou no mercado há quase um ano, já está instalada em 100 milhões de computadores. Contudo, em tecnologia, com seus 27 anos, há um forte sentimento de que, embora a empresa tenha aplicado um enorme esforço durante anos para proteger seu monopólio, o mundo a ultrapassou.

Em particular, o mundo da tecnologia hoje está centralizado na internet, onde o reinado supremo é do Google, e a Microsoft nunca conseguiu fazer sérias incursões nesse campo. Há alguns anos, lançou seu próprio serviço, o MSN. Empenhou-se para desenvolver um instrumento de busca que pudesse competir com o do Google.

Desenvolveu uma infra-estrutura de publicidade para colocar anúncios em outros websites - outra especialidade do Google - e gerar suas próprias receitas de publicidade. Em ambos os casos, continuou atrasada e sem lucrar. Por exemplo, apenas 4% das buscas na internet, em todo o mundo, são feitas com o instrumento de busca da Microsoft, comparado com as mais de 65% realizadas com o motor do Google.

"Das cinco maiores divisões", disse Brent Thill, analista de software do Citigroup, "a divisão online é a única que dá prejuízo. O problema são os engenheiros de software da Microsoft, seu DNA é muito diferente do DNA de alguém que desenvolve ativos online. É uma mentalidade diferente"

Além disso, as velhas estratégias que antes funcionaram tão bem para a Microsoft - quando o mundo ainda girava em torno do Windows - não têm mais lugar neste novo mundo. Em meados da década de 90, quando a Netscape representou uma ameaça para a sua hegemonia, a Microsoft criou seu próprio browser, o Internet Explorer, tornando-o parte integrante do Windows. E usou seu monopólio no campo do desktop para revidar. Finalmente a Netscape foi vencida - e o Departamento de Justiça processou judicialmente a Microsoft por violações antitruste.

Hoje a Microsoft não tem nem o poder de fogo nem agilidade para competir com o Google. Seu monopólio do sistema operacional não lhe dá nenhuma vantagem nessa batalha. As pessoas podem usar o sistema operacional da internet e o seu navegador para acessar a internet - e o Google - ou pode usar o sistema da Apple. Realmente não importa.

Entretanto, a cada nova mania na internet, como a atual febre das redes sociais, a Microsoft é pega de surpresa e precisa correr para entrar no jogo. Mas é sempre assim quando as empresas ficam muito grandes - e é por isso que as verdadeiras inovações partem das pequenas companhias, que não têm uma concepção das coisas predeterminada nem os lucros do monopólio para protegê-las.

A aquisição do Yahoo - supondo que realmente aconteça, já que estamos ainda muito longe de uma conclusão - propiciará a grande mudança para a Microsoft? Tudo é possível, imagino. Falei com vários especialistas em tecnologia que estão convencidos de que ela tem algum sentido.

Andy Kessler, investidor da área de tecnologia e escritor, qualificou essa proposta de compra como uma "jogada ofensiva inteligente". Para Mark Anderson, presidente do Strategic News Service , "eles vão ficar com o número dois online na área de publicidade, num bom momento e a um bom preço". Rob Enderle, do Enderle Group, disse que era apenas uma questão de tempo até que alguém apostasse na compra do Yahoo e "faz sentido que seja a Microsoft".

Mas sejamos honestos. A Microsoft não está comprando exatamente a maior empresa. Mesmo depois da fusão com o Yahoo, o Google ainda terá duas vezes mais o mercado de busca do que seu concorrente. O serviço de colocação de anúncios do Google é superior tanto ao da Microsoft quanto ao do Yahoo. E o Yahoo vem tendo dificuldades nos últimos anos. Ele poderia também ter se adiantado na área das redes sociais, suas salas de bate-papo podiam ser usadas facilmente para alguma coisa que rivalizasse com o Facebook. Da mesma maneira que a Microsoft, deixaram escapar a oportunidade. O Yahoo é claramente uma empresa que perdeu a rota. Tenho dúvidas se a Microsoft pode mudar o foco da empresa e transformá-la numa concorrente viável do Google.

Também me pergunto o que o Yahoo vai ganhar com o negócio - além de um ágio para sua ação enfraquecida. "A aquisição vai ajudar a sua marca?", indagou Mark Mahaney, que cobre o Yahoo para o Citigroup. "Não. Isso vai proporcionar a eles uma melhor tecnologia de busca? Não. Ela vai lhes dar uma maior força nas vendas de publicidade? Não. Suspeito que, neste momento, tudo isso está sendo questionado nas salas da diretoria", acrescentou.

O que mais me surpreendeu na sexta-feira foram as expectativas da própria Microsoft com relação à compra. Falando claramente, eram bem reduzidas. Quando conversei com Yusuf Mehdi, vice-presidente sênior da Microsoft no campo de parcerias estratégicas, o homem que está liderando grande parte dos esforços online da empresa nos últimos anos, ele não falou uma única vez em esmagar a concorrência nem mesmo sobre equiparar-se com ela.

Uma aquisição do Yahoo, disse ele, "será bom para os consumidores que desejam um outro motor de busca, editores de web que querem um outro serviço de colocação de anúncios e anunciantes que também querem mais uma opção além do Google. "Por causa do grande volume e os seus algoritmos, o Google é eficiente. Mas as pessoas gostariam de uma segunda opção também confiável."

Ele estaria dizendo que a Microsoft estaria contente em ser "essa segunda opção confiável?" Demorei para acreditar. Mas, mesmo quando insisti, ele reiterou. "As receitas de publicidade online devem chegar aos US$ 80 bilhões dentro de alguns anos", disse ele. "Isso significa uma tremenda oportunidade para todos os que estão no mercado. Existe espaço para outro protagonista confiável."

Penso no outono de 2005, quando Bill Gates visitou o The New York Times e um editor lhe perguntou se a Microsoft "faria com o Google o que tinha feito com a Netscape". "Não...", respondeu rindo. "Faremos algo diferente." Não é bem assim.

Fonte: Estadao.com.br